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sábado, 19 de novembro de 2011

O PARQUE - CAPÍTULO 1


Amigos, é muito gratificante ver que o blog está sendo visitado e acompanhado.
Obrigado a todos que me enviam e-mails e também aos que deixam comentários por aqui.
A idéia deste conto que começo a publicar hoje sugiu quando da inauguração do Parque da Juventude, onde era antes o famoso CARANDIRU. Eu gostei muito de escrever esta estória e espero que vocês também gostem.
Como é um pouco longa, publicarei em duas ou tres partes.
abraços a todos!
O PARQUE  - CAPÍTULO 1

Finalmente inaugurado!
Parecia um sonho!
Após quase dez anos de promessas, foi inaugurado o novo parque da cidade. Evento importante, que contou com a presença até do Governador do Estado.
Ninguém acreditava que a obra sairia do papel, pois o antigo prefeito era contra a construção de um parque, onde outrora fora o presídio regional, local que abrigou durante anos, bandidos de todas as espécies.
Mas, o povo falou mais alto e estava lá agora a Primeira Dama do Estado para cortar a faixa inaugural.
Era um parque muito bonito e bem projetado com áreas de lazer para todas as idades, 4 quadras de futebol, vôlei e basquete, 2 campos de bocha, jardins e um grande parque com brinquedos feitos de troncos de árvores e pneus.
No início vivia lotado, de dia e de noite, porém com o tempo, os brinquedos começaram a quebrar, não haviam mais redes nos gols. O parque começou a ficar sujo e abandonado.
Depois de muita insistência da população, a Prefeitura resolveu investir novamente, reformando tudo, cercando e colocando seguranças. Fizeram até uma portaria de onde os vigias tinham visão total do parque, que foi rebatizado com o nome da mãe falecida do atual prefeito.
Novamente o parque encheu, mas desta vez tinha hora para abrir e fechar. Funcionava das 8:00 às 21:00 hs. Duas equipes de seguranças se revezavam durante este horário e à noite a guarda ficava a cargo do Sr. Antonio, vigia aposentado, que fora transferido da sede da prefeitura.
Sr. Antonio era uma pessoa que transmitia calma e confiança a todos que conversava. Seus amigos o chamavam de "Seu Tonho". 65 anos, 1,67 metros, mulato e uma barriga que, se não fosse pela sua cor, poderia ser Papai Noel em qualquer loja da cidade.
As noites e madrugadas eram tranqüilas, dava até para Sr. Antonio tirar umas sonecas.
Mas depois daquela noite, tudo mudou...
Sr. Antonio foi acordado por barulhos e gritos que vinham das quadras localizadas no fundo do parque. Como as luzes ficavam apagadas, não conseguia identificar do que se tratava, mas parecia ser uma partida de futebol.
- Garotos malucos! pensou
- Como conseguem enxergar a bola?
Correu para acender as luzes no quadro que ficava atrás da mesa do chefe da segurança e ficou paralisado com o que viu, ou melhor, com o que não viu. No exato momento que acendeu as luzes, o barulho parou do mesmo jeito que havia começado.
Sr. Antonio assustou-se, mas mesmo assim saiu da portaria para ir ver de perto se não havia mesmo ninguém por lá.
- É, acho que minha idade está me pregando peças... Não tem nada aqui.
Por via das dúvidas, deixou as luzes ligadas até o amanhecer.
Naquela noite, não cochilou mais...
- Bom dia Seu Tonho, tudo bem?
- Sim Ribeiro, mais uma noite tranqüila.
Ribeiro era o primeiro segurança a chegar. Sempre vinha mais cedo para conversar alguns minutos com seu colega da noite.
Sr. Antonio resolveu não contar nada para seu amigo, tinha medo da gozação, ou pior, de levarem a sério e dispensa-lo de seu emprego tão bem vindo.
Sr. Antonio, apesar de ter muitos amigos, não gostava de ficar em casa e a idéia de ficar parado o apavorava.
Desde que Dona Cida, sua companheira por quase 40 anos, faleceu, Sr. Antonio não conseguia ficar em casa por muito tempo. Tentou morar com sua filha, mas não se acostumou com a cidade grande e preferiu voltar.
Alzira sempre que podia, vinha visitá-lo. Aí sim a casa ficava cheia de alegria. Seu genro, Pedro, era um homem bom e cuidava muito bem de sua filha e seus 3 netos.
- Seu Tonho reconsidere! Venha morar com a gente!
- Vamos Vô! Diziam os três netos em coro!
- Não, lá só vou dar trabalho. Prefiro ficar aqui. Quero ficar perto da minha Cida.
E mudava de assunto, tentando disfarçar seus olhos molhados.
No dia seguinte, Sr. Antonio, imaginando que o que ocorrera na noite anterior tinha sido apenas fruto da sua imaginação, deixou-se levar por mais um cochilo tranqüilo.
- Chuta! Vai logo!
- Assim não!
- GOOOOOLLLLLLLL!!!
Sr. Antonio pulou da cadeira, direto para a janela. Só que desta vez não acendeu as luzes imediatamente. Ficou ali parado ouvindo...
- Não foi gol não! Foi falta do Traíra!
- Calaboca Jubileu, daonde cê tá, não dá pra ver nada!
- Foi sim Pezinho, tenho certeza, o Traíra entrou for trás nas pernas do Catapora.
- E por acaso alguém te nomeou juiz da partida? Foi gol e pronto!
- Ta bom Pezinho, mas que foi falta, foi...
Pronto, agora o Sr. Antonio tinha certeza que não era sua imaginação. Tinha mesmo gente lá na quadra jogando bola no escuro.
- Agora eu pego estes moleques! Estão todos distraídos, eu chego lá, ligo as luzes no poste da direita e quero ver só!
E assim foi, pé ante pé, bem devagar para não correr risco de ser visto por ninguém.
Sr. Antonio não enxergava muito bem, e com aquela noite escura, sem lua, ficava impossível de ver alguém na quadra.
- Não me lembro de quando eu era garoto se via bem à noite! Esses meninos são meio malucos!
Pelo barulho, eles estavam na quadra do meio. Sr. Antonio foi bem de mansinho até o poste e rapidamente virou a chave.
- Peguei vocês seus moleques! Vão já pra casa, antes que eu chame a polícia!
Nesta hora Sr. Antonio paralisou. Não havia ninguém! O barulho acabou assim que as luzes foram acesas.
Por alguns segundos, pensou que estava louco, beliscou-se para ver se não estava dormindo.
- Ai! Meu Deus do céu...o que está acontecendo comigo?
E voltou correndo para dentro da portaria.
Naquela noite, não pregou os olhos, ficou todo o tempo olhando para o vazio e lembrando-se do acontecido.
- "Não foi gol!"
- "Foi sim....."
- Pezinho, Traíra, Jubileu, Catapora....Estes nomes não são estranhos, mas eu já ouvi aonde?
Pela primeira vez em todos estes anos, o Sr. Antonio preferia ficar em casa, mas o dever o chamava e lembrou-se que nunca tinha faltado, a não ser nos dias de agonia de sua querida Cida.
- Eu vou lá hoje e descubro tudo....É hoje!
Nem pensou em tirar seu cochilo habitual
À noite, mais ou menos no mesmo horário, lá estava ele de prontidão esperando o que quer se seja.
- Corre Jubileu ! Passa logo ! Tô sozinho !
- Escanteio !
Sr. Antonio nem ouviu a segunda frase e saiu em disparada em direção das quadras.
- Quem está aí? Não adianta querer me assustar ! Venham aqui seus moleques !
- Calma seu Tonho, não tenha medo...
- Cê tá lôco Pézinho? Esqueceu das regras?
- Deixa disso Jubileu, não tá vendo que ele tá branco de medo? Assim o homem vem pra cá rapidinho!
Seu Antonio não acreditava no que via... De todos os cantos da quadra começaram a aparecer vultos que tornavam pessoas, bem na sua frente...
- E agora? O que a gente faz Jubileu?
- Explica pra ele, foi você que ele viu primeiro, Pézinho!
Durante alguns minutos, Sr. Antonio ficou sem se mexer, teve medo até de se beliscar. A visão que estava tendo ia de encontro a todas as suas crenças.

- "Pára com isso Antonio, acho mesmo que está na hora de ir morar com a Alzira"... pensou
- Isso não pode estar acontecendo. Quem são vocês? Porque estão me pregando esta peça? Isso é coisa do pessoal da repartição?
- Peraí, uma pergunta por vez...
- Pra começar, não é peça nenhuma, só estamos aqui esperando a nossa vez. Disse Pézinho
- Que vez?
- De ir embora! Falou Jubileu, meio impaciente.
- Ir embora para aonde?
- Pra casa lá em "cima"! Não entendeu ainda Seu Tonho?
As coisas começavam a clarear... Sr. Antonio estava diante de condenados, antigos residentes da penitenciária que fora destruída para dar lugar ao parque.

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